sábado, 6 de maio de 2017

O Cristo cego do deserto chileno

O Cristo cego do deserto cinematrográfico chileno comove pela fotografia árida, pela singeleza dos diálogos, pela simplicidade da gente das comunidades daquela área, filmada pelas lentes do diretor Christopher Murray.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Oração pela sobriedade de um homem comum




Hoje me desafio a ser um homem melhor. A falar com aquela pessoa, talvez um abraço nela.
Que tal um cigarro a menos? Só por hoje.
Que eu faça de hoje um dia só de verdades, elimine da minha vida a doença da mentira.
Só por hoje, resistirei a beber um gole (de álcool) sequer. É difícil, mas só por hoje, não é impossível.
Poderia só por hoje trocar a cocaína por café? Distrair a fissura ouvindo uma canção que me faz bem. Só por hoje, porque Deus é misericordioso.
Vou respirar e inspirar calma no trabalho hoje. Amar profundamente aquela pessoa que desfia a minha paciência.
Quero deixar aquele doce de lado e beber mais água.
Seguro de paz vou falar menos, olhar mais. Dizer só o necessário.
Vou comer na medida certa, sentir mais leve.
Só por hoje, vou me desfazer da arrogância. Vou sorrir para uma criança. Falar com o porteiro. Chamar o chefe para um café. Perguntar para meu colega sobre seu projeto. Mostrar interesse. Vou querer entender.
Hoje não vou gritar com ninguém. Falarei com mansidão. Aceitarei o que os outros dizem. Ouvirei.
Hoje vou telefonar para meu amigo. Há muitas maneiras de acalmar a alma, esta é uma delas. Por isso, só por hoje, nenhum calmante.
Só por hoje vou afastar a tristeza que faz de mim um homem ruim. Terei hoje consciência dos problemas dos outros. Compartilharemos nossas angústias em busca de soluções.
Hoje será mais um dia. Ao final dele direi: foi só por hoje, graças a Deus!
 Amém

terça-feira, 17 de março de 2015

WW

 
Tá! A televisão era em preto-e-branco, quase não dava para ver, mas eu a achava realmente maravilhosa. Não sabia que o short dela tinha como estampa a bandeira dos Estados Unidos da América, apesar de identificar que havia estrelas bem definidas. Sei que ia para a escola com o cabelo em rabo-de-cavalo igual ao da Diana Prince, isso eu achava o máximo. Chegava em casa dava um giro, simulava tirar os óculos que não existiam, balançava a cabeça para soltar o cabelo e num passe de mágica virar super-herói. E como era linda a Lynda Carter! Fiquei triste quando descobri muito tempo depois, sem nem desconfiar da dublagem tosca, que ela não falava português. Nem assim entendi, eu que já sabia ler, porque os “emes” da mulher maravilha eram de cabeça para baixo.
 
 
 

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Pensamentos equatorianos




"Se meu pai fosse um índio, como parecia que era, seria um Inca."

"Um lugar de margaridas sem caule, esparramadas pelo chão."

"Acalma caminhar entre as milhares de valerianas espalhadas pelas montanhas do planalto andino equatorial."

"Eu nunca tinha visto uma planta de valeriana, acalma olhar para as flores pequeninas."

"As llamas são uma mistura de cavalinho com cabra, dóceis e elegantes."

"Os vulcões são tão grandiosos, que cá de baixo achamos que estão encobertos de nuvens. Isso para nós que somos pequeninos, lá em cima estão sempre livres."

"São tão magníficos e onipresente que de todo canto é possível vê-los."

"Só uma fumacinha, só uma roncadinha, só isso que eu desejo, por favor, Mama Tungurahua nos protege."

"As índias carregam tudo nas costas, coisas sem fim, pesadas, e até crianças."

"Mulheres com crianças dormindo nas costas envoltas em panos."

"As crianças trabalham desde pequenas com seus pais, no começo ficam presas no pano nas costas, depois pelo chão."

"Era só ele na imensidão do mar de nuvens, gigante, soberano, maior de todos, grandioso Chimborazo, e eu uma criança que aprendeu a andar de bicicleta."

"Eu era uma criança que ria à toa, ainda mais pequenina perto dele gigantesco e onipresente em todo canto em que eu caminhava no seu pescoço de Lua."

"Esse é o primeiro gelo da minha vida." 

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Fumacinha do frio

 Era inverno e o friozinho matinal dava preguiça de ir à escola. Toooooinnnnn! Tocou o sinal. Já ninguém estava, só o frio. A menina entrou correndo pelo pátio e subiu as escadas com os cachinhos balançando. Parou atrasada no lance da escada para ver da janela a névoa de algodão que pairava no jardim. Foi aí que aconteceu. Com a boca entreaberta soltou, por acaso, o ar da respiração. Para sua surpresa, saiu uma fumacinha branca da boca, mágica. Sob encanto, soltou um riso largo. Nunca mais se esqueceu disso.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Os colares de Marina

Marina, morena, vem vindo em busca da presidência do Brasil, sem se pintar. Uma presença forte, de um corpo que parece frágil, com semblante que remete ao povo das florestas do Norte. São muitas as críticas e considerações sobre o provável comprometimento de seu mandato com posturas defendidas pela congregação evangélica a que pertence, principalmente no que se refere às questões das relações homoafetivas, do aborto e outros tantos temas que nenhum dos candidatos se atreve a abordar. Marina foi fadada ao conservadorismo e ao retrocesso por alguns críticos. Mas a presença de Marina é ainda muito mais inusitada, com seu cabelo sempre preso, com típico penteado em coque da senhorinhas da Assembleia de Deus, revoluciona nos modelitos, descartando os tradicionais terninhos. Apareceu diversas vezes com estampas que lembram a floresta e colares, muitos colares de sementes de açaí, mulungu, licuri, jarina e haste de palmeira pupunha. São colares de todos os jeitos, dona de um estilo próprio, mas com toque das tribos ashaninka e navajos, Marina se enfeita de Amazônia.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

A fotografia de Vivian Maier


O olhar pelas lentes da Srta. Vivian Maier é comovente. A precisão com que imortalizou cada uma das cenas das cidades de Chicago e Nova York naqueles anos 50, remonta ao legado e relíquia deixada por uma grande artista. O acervo de Vivian Maier contém milhares de fotografias que trazem para os dias de hoje os encantos de uma época que ficou para trás, de cotidianos esquecidos.  São cenas impressionantes, carregadas de realismo e beleza, impregnadas de pessoas comuns. A principal motivação: o acontecimento. 

Os momentos captados pela babá artista, que viraram fotografias, revelam segundo especialistas, que além de possuir o domínio da técnica, Vivian escolhia meticulosamente o que ia fotografar e o fazia com encanto e frieza. O acervo contém também inúmeros ousados auto-retratos, inclusive da sombra da própria artista, curiosamente nunca mostrados a alguém. Sua obra foi desconhecida durante seu tempo de vida.

Todo o material fotográfico da Srta. Maier foi encontrado por acaso por John Maloof, um historiador e corretor de imóveis de Chicago, que ao descobrir o tesouro que tinha em mãos resolveu explorá-lo. Em 2011, John organizou a primeira exposição individual com as fotografias da Srta. Maier e o reconhecimento foi imediato. Depois foram lançados livros e filmes. Recentemente houve o lançamento no Brasil de "Vivian Maier: Uma Fotógrafa de Rua" [Autêntica, 136 págs., R$ 108], editado por John Maloof, com prefácio de Geoff Dyer.

Em 1958 Vivian Maier passou pelo Brasil em uma viagem de quase três meses pela América do Sul e Central. As fotografias dessa viagem estão sendo analisadas. Entre os registros que fez provavelmente deve ter imortalizado momentos e cenas do Rio, São Paulo e Amazônia por onde passou. No segundo semestre de 2016 seremos contemplados com uma exposição no MIS (Museu da Imagem e do Som) de São Paulo.

Os filmes especulam a vida solitária da babá e fotógrafa, que não se casou, não teve filhos, sem parentes ou amigos próximos. Viveu como uma sombra, escondida, roubando momentos alheios e imortalizando-os nas fotografias perfeitas. Como disse Geoff Dyer parece algo inglório, talvez cruel, mas Vivian Maier é alguém que só existe nas coisas que viu. Nesta, que parece uma história bonita carregada de tristeza, o consolo nos vem nas palavras da jornalista e roteirista Rose Lichter-Marck quando diz ter a impressão que Vivian Maier "era alguém bastante livre, que gostava de estar à margem, e que viveu a vida que quis viver".